Faz hoje, dia 19 de Maio, 55 anos que Catarina Eufémia foi assassinada.
Catarina Eufémia nasceu em Baleizão, em 1928, e começou a trabalhar criança.
Nos anos 50, o proletariado agrícola alentejano fervia de revolta face às aviltantes condições de trabalho. Aos 24 anos, adere ao PCP, e pouco depois, já no Comité Local, lidera a organização de mulheres da sua terra.
Em 54, a luta ganha novo fôlego, enquanto os latifundiários e o seu governo fascista tentavam por todos os meios impor jornas baixas. Multiplicam-se amplas comissões de unidade nas Praças de Jorna.
Em Baleizão, perante a recusa do latifundiário em pagar uma jorna digna, os trabalhadores entram em greve a 15 de Maio. Tentando furar a unidade o latifundiário recruta trabalhadores de outra aldeia. O povo marcha então a 19 para a herdade, para juntar à sua luta os novos contratados. O que consegue sem dificuldades. A GNR cerca a herdade e obriga os novos “contratados” a trabalhar sobre as suas armas. Mas o povo de Baleizão não desiste, e perante a sua unidade a GNR deixa uma Comissão de mulheres passar o cordão policial para negociar.
Catarina lidera esse grupo, grávida do seu quarto filho, o com o mais novo, de 8 meses ao colo. O tenente Carrajola pergunta-lhe “Que queres, bruta?”, “O que eu quero é pão para matar a fome aos meus filhos!”.
A resposta soou em três tiros desfechados à queima-roupa. Às 11.00 da manhã, de pé e sem medo, morria Catarina Eufémia...
Este assassinato a sangue-frio foi uma das mais brutais acções do regime de Salazar, causando uma revolta surda e contida entre as massas rurais alentejanas.
Catarina tornou-se, depois da sua morte trágica, como um símbolo, principalmente entre o Partido Comunista Português, como um modelo de mulher, mãe e militante. Muitas vezes se lhe jurou vingança, tal foi a raiva de dor que pulsou durante décadas no Alentejo por aquel morte estúpida e cruel, aparecendo também flores na campa de Catarina, no cemitério de Quintos, depositadas por desconhecidos.
Os cantores de intervenção e os poetas opositores ao regime não deixaram também de cantar a pobre camponesa assassinada: José Afonso, Sophia de Mello Breyner ou José Carlos Ary dos Santos, entre outros. No imaginário popular e oposicionista, o assassinato de Catarina Eufémia era a demonstração clara da crueldade e brutalidade dos métodos e formas de resposta por parte do regime às desigualdades e injustiças que apoiava e mantinha.
Com a devida vénia, um poema de Sérgio O. Sá dedicado a Catarina Eufémia.
CHAMAVA-SE CATARINA
Rica de fome,
Pobre de pão.
Chamava-se Catarina,
Trágica foi sua sina.
Seus, teve apenas dois braços,
Braços de mulher, franzinos,
Três filhos bem pequeninos,
Esperança e tantos sonhos
E uma voz inocente
Que não conhecia o medo.
Por isso morreu tão cedo.
Rica de fome,
Pobre de pão.
Em terras do Alentejo
Uma MULHER disse NÃO
À injustiça do tempo.
Por isso morreu tão cedo.
...mataram-na à traição!
Seu sangue puro regou
Os campos de Baleizão.
Quando foi a enterrar
Amortalhou-a a razão.
Rica de fome,
Pobre de pão.
Mataram-na à traição.
Da sua voz inocente
Ficou eco, um eco ingente.
Trágica foi sua sina.
Não terá morrido em vão.
Chamava-se CATARINA!
1978, in; Sérgio O. Sá, VERSOS NA GUERRA - VERSOS DE PAZ
1 comentário:
Carissimo Marius...
O primeiro papel em teatro que interpretei era ainda muito nova, tinha 3 ou 4 anos e a peça incluia uma dramatização da história de Catarina Eufemia. Eu fazia o papel do "filho" que Catarina levaria ao colo... Passados muitos anos, quase trinta nasceu a minha segunda filha. Chama-se Catarina e espero que saiba ser uma mulher à altura daquela cuja história me deixou uma marca para sempre...
Um grande beijinho
Helena Peixoto
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